segunda-feira, 19 de maio de 2014

C20 - Divergente

eu nem sabia que Jogos Vorazes era uma franquia de livros quando vi o primeiro filme, e me arrependi loucamente de não os ter lido antes (não vou entrar no mérito da adaptação, mas eu ia querer ter vivido as twists da história com a profundidade que o livro me proporcionou).

por isso, quando vi o "trelho" de Divergente (que achei péssimo, por sinal), meio que me obriguei a ler os livros antes de ver qualquer coisa -- eu não queria que me roubassem a emoção do livro, e eu estava certa.

voltando ao trailer: incrível como passa uma imagem que não condiz com a história... mas não vou entrar na polêmica spoiler zone por isso.

sobre o filme, tirando umas coisinhas absolutamente desnecessárias [como a alteração do encontro com a mãe dela e a forma como a erudição foi parada], foi uma boa adaptação.

sobre o cinema, que bagaceira! muitas cocotas juvenis suspirando audível e compreensivelmente toda vez que o Theo James aparecia (não posso julgar os suspiros delas, eu estava no coro, mas os meus não eram uma crise de asma!), e as três cunhãs que sentaram atrás de mim eram de uma categoria à parte!

primeiro, acho que elas levaram um galeto pra sala de exibição, dentro de uma marmita de alumínio. passaram a sessão inteira afofando a embalagem, eu quase que pacificamente me virei e dei um calmo tabefe na cara delas...

mas o pior foi uma súbita catinga de cheetoos bola que subiu no cinema... quando eu olhei para o lado, a cutruca mais zuadenta e gasguita tinha impindurado os pés na cadeira ao meu lado, e a fragrância maravilhosa se espalhou pela sala! me arrependi de não ter vick vaporub na bolsa, ou mesmo um desodorante pra tacar na criatura!

apesar destas intempéries, foi um filme muito divertido, especialmente por ter ido com a Bruna, que está comigo na luta para criarmos um movimento pró-clonagem humana pra ontem: todas quer Theo James!

eu poderia, finalmente, citar mil motivos para assistirem a Divergente, mas cito apenas Quatro:

bons são meus tios, que me dão dinheiro; Theo James é ÓTIMO!

terça-feira, 13 de maio de 2014

C19 - Amante a Domicílio (sic)

este é daqueles filmes que me chamam levemente a atenção, mas não o suficiente para atravessar a cidade para vê-lo, a não ser que valha a pena, e a rara companhia nas telonas valeu o sábado :)

com um título em português pavoroso e dono de desilusão ortográfico-amorosa, Fading Gigolo tem como chamada "a profissão mais velha ficou ainda mais velha" (livre tradução).

Woody Allen, neurótico como sempre (talvez até um pouco mais), interpreta Murray, um dono de livraria de exemplares raros que entrou em falência.

em conversa com o seu ex-ajudante no trabalho e amigo Fioravante (John Turturro), ele conta que a sua dermatologista lhe contou que queria muito fazer um ménage (!!!), mas que precisava de um homem para se juntar a ela e uma amiga.

Murray declinou do convite (hahaha) com o humor depreciativo característico, mas disse que conhecia alguém que poderia ajudá-las, e propôs ao amigo que entrasse no esquema, por mil dólares a hora.

depois de muito relutar, afirmando que nem bonito era, e que não queria se prostituir, Fioravante foi convencido e se encontrou com a dermatologista (Sharon Stone, que está lindíssima, aquela égua!), para um "test drive".

a partir de então, Fior acumula o seu trabalho em uma floricultura com a vida de amante em domicílio.

trata-se de um filme reto, com poucas reviravoltas, mas gostoso (uuuui!) de se ver, pela loucura de Allen e dos outros personagens.

e foi nesse filme que eu percebi que, a minha vida inteira, eu nunca soube que o John Turturro não era o Michael Richards (que fez o Cosmo Kramer, em Seinfeld, e o Assassino da Gravata Borboleta, em O Pestinha)!

pena que eu só tive consciência disso depois de imaginá-lo fazendo os trejeitos do Kramer, durante a sua jornada dupla! ;)

segunda-feira, 12 de maio de 2014

C18 - Lunchbox

Lunchbox é um filme indiano sobre pessoas presas ao seu próprio cotidiano, onde, muitas vezes, não percebem que a chave do cadeado está na sua mão (pode parecer plot de autoajuda, mas não é mesmo!).

o filme começa apresentando a rotina de duas pessoas: a primeira delas é Ila, mãe, dona de casa e esposa, que, após enviar a filha para a escola, prepara com esmero o almoço para o marido, e o envia por um senhorzinho de bicicleta, por um longo e tenebroso percurso em meio a ruas caóticas, trens e riquixás.

o segundo personagem é o Sr. Fernandez (apesar de ser a cara do Professor Girafales -- não fique com ciúmes, Ricardo Darín! --, não é latino), viúvo, solitário e contador.

é ele quem recebe a marmita que Ila mandou. Fernandez destampa as cumbucas e, quando o cheiro sobe, ele fica com aquela cara do Anton Ego comendo ratatouille, no filme homônimo.

Ila recebe de volta a marmita, assombrada por ela ter sido completamente devorada e praticamente lambida de cima a baixo. quando o seu marido chega, ela não compreende por que ele não faz nenhuma referência à comida, e percebe que a sua marmita foi enviada para a pessoa errada.

ela resolve, então, mandar um bilhete para quem a recebeu e, a partir de então, de uma maneira só deles, estas duas pessoas tão diferentes e tão sozinhas começam a se comunicar.

é de uma delicadeza rara nas telas a maneira como eles se aproximam e começam a mudar a vida um do outro.

e, mesmo sem a dancinha no final da maioria dos filmes indianos (perdão pelo spoiler!), que filme lindo!

C17 - O Palácio Francês

com um breve intervalo após o filme anterior, fui para o segundo do dia. não sei por que, mas eu sempre me espanto com a sala lotada, geralmente por pessoas mais velhas, no cinema mais alternativinho de brasólia (o liberty small).

mal sentei e o filme começou, me causando uma certa confusão para entender o que se passava. Arthur, recém formado, estava sendo entrevistado pelo Ministro de Relações Exteriores francês, que era, para dizer o mínimo, um pouco descompensado.

Arthur foi trabalhar diretamente na equipe de assessoria do Ministro (que lembrava terrivelmente o Comandante Lassard, do Loucademia de Polícia), escrevendo os seus discursos.

enquanto Arthur era demandado com coisas absolutamente estapafúrdias, o cinema inteiro caía na gargalhada, mas só me dava vontade de chorar!

depois de vir de 357 estágios onde os chefes eram completamente insanos (uma vez "sugeriram" que eu me vestisse de coelho, na páscoa, só para que tenham noção!), hoje trabalho no executivo federal e, muitas vezes, presencio esse tipo de coisa.

não me dá nenhum alívio saber que não sou só eu e os meus amigos que passamos por perrengues semelhantes, pelo contrário: se fosse só com a gente, era mais fácil de se erradicar esse tipo de coisa!

do meio pra frente eu consegui me desvencilhar do objeto, e rir junto dos demais (apesar de uma parte de mim se manter chorando por dentro)... é um bom filme, mas seu roteiro me foi muito doloroso, para ter, mesmo, valido a pena.

tomando como base o ditado "quem bate, nunca lembra, mas quem apanha, não esquece!", acho que já apanhei demais, nessa vida.

C16 - 7 Caixas

depois de mais de mais de um mês de jejum de cinema, voltei às telas com 7 Caixas, paraguaio, cujas únicas informações que eu tinha eram o trailer frenético e a alcunha de "Cidade de Deus paraguaio", seja lá o que isso significasse.

Víctor, um garoto pobre e que sonha em estar na tv, trabalha como carregador de compras em um feira. quando a irmã lhe mostra um celular que filma (um nokia de 1900 e bolinha), ele resolve conseguir uma grana para comprá-lo.

com um roteiro cheio de reviravoltas, ambientado no meio de muita cor, barulho e pobreza, o filme é, como o trailer o havia antecipado, frenético.

não vou me perder em palavras tentando descrever o misto de claustrofobia e de taquicardia que 7 Caixas me despertou, pois essa é uma experiência que merece ser vivida.

ele conseguiu unir várias ideias simples de uma maneira inusitada, abusando da dicotomia brutalidade/doçura. sem dúvida alguma, um dos melhores filmes que vi esse ano!

sexta-feira, 9 de maio de 2014

L10, 11 e 12 - Trilogia Divergente

ainda não me recuperei destes livros. fazia muito tempo que isso não acontecia, inclusive. a loucura é tanta que nem vou tentar organizar as ideias de forma muito cronológica, porque sei que não conseguirei.
comecei os livros na penúltima quarta de abril, e os terminei na terça seguinte, com um final de semana em Fortaleza no meio. foram os primeiros livros que resolvi pegar, depois de ter ficado tanto tempo em função do último concurso (onde ganhei experiência e raiva, mas assim é a vida).

naturalmente, o tema me atrai muito, sou aficionada por distopias. acredito que, entre a realidade e a ficção há uma linha, tênue e difícil de se estabelecer, onde elas, as distopias, moram. e precisam ser críveis, independente de quão fantásticas sejam.

o primeiro livro, Divergente, me apresentou a um mundo dividido em 5 facções (Abnegação, Amizade, Audácia, Erudição e Franqueza), cada uma delas com um papel fundamental e diferente para o (bom) andamento do mundo.

admito que achei o plot meio fraco, mas devorei o primeiro livro absurdamente rápido, curiosa e desconfiada. também admito que depois de algumas experiências meio traumáticas relativamente recentes, fiquei com receio de que a autora não desse conta do que havia se proposto.

comecei o segundo livro nessa vibe de "não quero me apaixonar", mas já tava arriada os 4 pneus e o estepe (eu sou uma viadinha, sei disso)!

um ponto recorrente na história de Tris, narrada por ela mesma e com a sua visão de mundo, é o questionamento constante sobre as suas próprias escolhas e seus medos. e, ainda que pareça uma temática de terapia, a relação da protagonista com os seus medos pode soar comum, mas, nesta história, ela é bem mais aprofundada.

eu estava no avião, sem conseguir desligar o kobo um segundo, quando começou uma turbulência from hell. o cara que tava na minha frente começou a se benzer, uma senhora do outro lado começou a audivelmente rezar, e, no meio de toda uma discussão no livro sobre medos (legítimos ou não) e como enfrentá-los (ou conviver com eles), eu quase quebrei.

não que eu tenha medo de avião, mas minha mãe tem. e essa era uma das raríssimas viagens em que estávamos no mesmo voo, ambas indo pra terrinha, para o aniversário do meu sobrinho. ela estava na parte da frente do avião, e eu no fundão, como de praxe.

me deu uma vontade de me levantar e de ir até ela, pra que ela não se apavorasse, mas o que eu podia fazer? e o que eu podia fazer para tranquilizá-la, se eu já estava ficando também com medo? crianças choravam alto, a mulher voltava à sua novena, e o voo ainda demorou para se estabilizar, ainda com turbulências eventuais.

nesse momento, 357 epifanias pularam na minha cabeça, e eu fiquei pensando no que podia fazer, caso me fosse dada a oportunidade de sobreviver àquele voo. hoje, duas semanas depois, posso parafrasear Parmênides e dizer que nem era o mesmo céu e nem eu a mesma mulher, a voltar dois dias depois.

quando finalmente descemos, fui falar com a minha mãe, saber como ela havia passado por toda aquela celeuma, e ela me devolve: "que turbulência? que horas? não vi nada, dormi o voo inteiro!"... eu morrendo por dentro e ela nem aí? peloamorde!

voltando ao livro, não consegui parar de lê-lo, mesmo estando só o resto. terminei o segundo no sábado, mas só pude ler o terceiro como deveria quando voltei pra brasólia.

devorei o último livro com ainda mais desconfiança, porque eu já sabia que a autora não daria ponto sem nó. apesar de, em alguns momentos, achar que o livro tinha se reduzido a "too much snogging", percebe-se que não há palavras desperdiçadas.

então o livro acabou e eu me senti irremediavelmente despedaçada, como há muito não me sentia. feliz, por ter passado por toda aquela história com personagens que eu conheci melhor até do que conheço algumas pessoas da minha família, mas com um vazio de saudades.

vou tentar ver o filme em breve, para ver se me ajuda a superar esta separação (aloka!)

sexta-feira, 11 de abril de 2014

L09 - Doroteia

fazia muito tempo que eu não lia uma peça, e essa do Nelson Rodrigues pulou na minha cabeça. já de cara vi que estava diante de algo fora do imaginário conhecido rodrigueano, pois não há nenhum personagem masculino em cena (apesar de haver citações a homens).

Doroteia bate à porta das primas ("acho lindo ter parente!"), pedindo asilo e ajuda. a casa é habitada por 3 viúvas e a filha de uma delas. todas muito pudicas, trajando vestes longas negras, orgulhosas de serem mulheres de bem e acima das tentações mundanas.

as senhoras a recebem mal, pois tinham duas primas chamadas Doroteia: uma, morreu afogada; a outra, perdeu-se na vida e nos homens. qualquer uma das duas que batesse à porta não seria bem-vinda.

as mulheres da família têm uma espécie de maldição: elas não podem ver homens, mesmo que eles as carreguem nos braços. e todas elas precisam se manter puras até o casamento, para terem uma "náusea" nas núpcias (outra nefasta tradição familiar), caso contrário, elas nunca poderão morrer (a não ser que se suicidassem, mas isso também não era aceito)

quando Doroteia assume que é a que virou puta (extremamente arrependida), as primas afirmam que preferiam que fosse a que tinha morrido (suicidou-se porque não podia suportar que, por debaixo de toda a pureza das suas roupas pesadas, houvesse um corpo nu, capaz de pecar).

Doroteia assume o que fez, pois, aparentemente, ela podia ver os homens e nunca teve a tal náusea. mas ela tinha tido um filho, que morrera com poucos meses, e, pela memória dele, não queria se envolver com homens nunca mais. porém, sabia que a carne era fraca, e apenas se tornando uma delas, poderia se afastar das tentações.

é uma peça cheia de simbologias e sutilezas, o que também me remete à capa do livro, uma obra de Mondrian. talvez apenas a geometria possa explicar o que as palavras não conseguem... a perfeição das linhas e os tamanhos diversos arrumados em paralelo unem-se em um quebra-cabeças belo, mas sem sentido.

na história, o homem é representado por um par de botinas desabotoadas (quase o equivalente a tomou banho de sunga branca!, de safadeza) e na casa "todos os quartos morreram e só as salas vivem!" -- as primas não dormiam, pois podiam sonhar com algo pecaminoso.

as primas afastam Doroteia, acusando-a de ser bonita demais para ser uma mulher direita: "teu hálito é bom demais para uma mulher honesta!" ou "espinha em mulher é bom sinal! não acredito em mulher de pele boa!".

e então começa a saga de Doroteia para se tornar uma mulher digna e feia. D. Flávia, a prima mais ferrenha, indica-lhe que se encontre com Nepomuceno, um homem atormentado (que foi muito gentil com ela), para lhe pedir chagas que cobrissem o rosto e o corpo. fica na imaginação do leitor que pedaço de alma (ou de corpo) ela teve que dar para ter o desejo atendido.

é muito interessante ver, ainda que Nelson Rodrigues tenha escrito tudo ao contrário, a busca pelo padrões de beleza (onde é belo ser horrendo, pois denota caráter): a busca para que a embalagem seja mais agradável aos olhos, geralmente melhor do que o próprio conteúdo.

atual e visceral, Doroteia mostra a necessidade de se anular para ser aceita (e para se aceitar).

quarta-feira, 9 de abril de 2014

L08 - Orgulho e Preconceito

sei que sou uma viadinha que gosta de histórias de amor, mas também gosto ainda mais de ter a minha inteligência respeitada, e eis o motivo por eu adorar Orgulho e Preconceito.

o filme eu já devo ter visto trocentas vezes, graças à tv por assinatura, que o reprisa ad infinitum, e ao maravilhoso Mr. Darcy (aaaaaaaaai, papaaaaai!).

mas hoje eu vim falar do livro, publicado no começo do século 19, por Jane Austen (que o havia escrito aos 20 anos).

foi um exercício interessantíssimo ler as ideias de uma mulher tão jovem, escritas em uma época em que mulheres eram "feitas" para se tornarem esposas, mães, mas nunca para exercerem atividades tidas, à época, como exclusivamente masculinas, como a produção literária.

[digressão]
me lembrei agora da defesa que uma colega fez na faculdade, explicando que as revistas femininas tinham menos páginas de matérias (e mais propagandas) porque eram voltadas para mulheres intelectualmente ativas (sic), que podiam lê-las mais rápido (!!!)
[/digressão]

voltando à trama, a protagonista, Elizabeth (Lizzy) Bennet é a segunda de cinco irmãs, não é ingênua como a primogênita, nem deslumbrada e fútil como as duas mais novas. Lizzy é crítica, espirituosa e leal à própria família, apesar de ter consciência de que a mãe é uma completa desmiolada e o pai é omisso.

a rotina da cidade onde moram muda com a chegada de um cavalheiro rico com a sua família, Mr. Bingley, e de seu amigo, Mr. Darcy (ainda mais rico). a partir de então, Darcy e Lizzy se encontram e se reencontram, meio a equívocos e gestalts forçadamente fechadas, onde talvez a moral da história seja "cuidado com julgamentos precipitados".

a escrita em alguns pontos é meio confusa, mas a essência não se perde: por baixo da relação entre os dois, há critica, muitas vezes mordaz, sobre o estilo da sociedade naquela época e seus valores.

pela boca da personagem, a autora questiona a instituição do casamento, a relação entre irmãos, os direitos que os mais velhos (e abastados) julgavam ter para decidir a vida dos que estavam ao seu redor e que deles, de alguma forma, dependiam...

mas o que mais me chamou a atenção foram os momentos em que as irmãs ficaram extremamente surpresas que um dos personagens, tido por elas como muito bonito e educado, pudesse ser mau-caráter (para elas, era inconcebível que uma bela figura não tivesse sentimentos e ações igualmente belos).

esse tipo de nuance se perde no filme, que dá um enfoque bem maior ao romance propriamente dito do que à construção e desconstrução dos protagonistas.

mas continuarei a ver o filme sempre que tiver que precisar esperar para ganhar mais vidas no candy crush, por motivos de quem nunca?:

status: vim a óbito!

segunda-feira, 31 de março de 2014

C15 - Tudo por Justiça

o plano original para o sábado era vermos um dos filmes que estão em cartaz da mostra Panorama de Cinema de Burkina Faso, no ccbb de brasólia, mas houve um evento no mesmo dia, e não conseguimos atravessar o mar de carros para termos esta experiência maravilhosa.

diante da negativa do universo, e, entre as poucas opções em cartaz (excetuando o que já havíamos visto, óbvio), escolhemos Tudo por Justiça, produzido pelo Leonardo DiCaprio e pelo Riddley Scott e protagonizado pelo Christian Bale.

admito que ainda tenho problemas com o Christian Bale, desde que ele fez o Batman mastigando carrapicho, mas curti muito a atuação dele no Trapaça para deixar de ir ao cinema por causa dele...

voltando ao filme: meldels, é péssimo! é quase uma versão masculina dos romances da Danielle Steel, onde o protagonista sofre, sooofre, soooooofre, mas continua acreditando no papai noel e no coelhinho da páscoa.

o cara é super correto, mas é preso, semicurrado, abandonado pela namorada pelo Forest Whitaker (!!!), o pai morre enquanto ele tá na prisão e o irmão, veterano de guerra, surta. ainda assim, o caráter do personagem de Bale (Russell Baze) não oscila um milímetro.

quando o irmão se envolve com um povo barra pesada, ele resolve assumir o título em português do filme, mas o seu temperamento trabalhadíssimo na inércia estática o impede de fazer algo além do pouco que ele faz na vida, que é respirar e eventualmente se mexer.

depois de muito divagar sobre a garyoldmanização do Christian Bale, de pedir a deus um controle remoto para passar logo para o final, e de presenciar um povo batendo boca (acho que falavam de futebol, whatever), o filme começou a parecer, pra mim e pro mofi, uma citação d'O Processo (Kafka, adaptado por Orson Welles).

garyoldmanização de Christian Bale
em O Processo, Josef K. passa o filme inteiro fugindo (não sabe do quê, mas está sendo acusado de algo) e clamando pela sua inocência. em um final construído com elementos semelhantes, aquele que passou o filme inteiro na inocência finalmente se torna culpado. e o filme acaba, quando deveria, de fato, começar.

de todos os que eu vi no cinema em 2014, este foi o pior, com louvor. quem sabe, se se chamasse Tudo por um Shampoo sem Resíduos, fosse melhor.

C14 - Prenda-me (Arretez Moi)

era sexta-feira e nessa brenha chamada brasólia não estreou quase nada: os filmes que estão em cartaz ou são uó ou estão em horários ainda pEores. mas é claro que há filmes bons (ainda não assistidos), grazadeus!

pela sinopse maravilhosa (mulher resolve ir à delegacia se entregar como assassina do marido, que já havia morrido à quase 10 anos e que a polícia havia concluído que se tratava de suicídio), resolvemos (mofi e eu) ver o Arretez Moi no Liberty Small (hipocorístico dado pelo @philosopop, que levei para a vida).

trata-se de um filme de diálogos fortes, acompanhados pelas primorosas atuações de Sophie Marceau como "a mulher que matou o marido" e Miou-Miou como a policial truculenta e que se nega a prender a "assassina".

a trama fala da violência e dos seus efeitos secundários, como o medo de quem é vítima, os abusos constantes, a violência mental tão ou mais dolorosa que a física, os filhos presenciando o comportamento e, muitas vezes, repetindo-o...

é um filme que faz com que nos questionemos em vários aspectos, inclusive sobre os julgamentos que fazemos às vítimas do abuso, como "por que ela não denunciou antes?" ou "quem se submete a esse tipo de coisa?"...

e é interessantíssimo perceber que, às vezes, há mais liberdade em estar fisicamente preso do que poder ir e vir, mas sempre acompanhado de demônios e culpa.

L07 - Diálogos Impossíveis

adoro Luis Fernando Veríssimo! a sua capacidade de contar histórias riquíssimas (e insanas) em poucas linhas é o que mais me fascina e atrai.

já li muitos livros dele, mas nenhum me marcou mais do que uma coletânea chamada O Nariz e Outras Crônicas. acho que foi nesse paradidático que percebi que o que apreendemos depende muito do nosso espírito quando lemos, e que é bastante interessante revisitar alguns textos, de vez em quando.

quando eu penso naquele livreto companheiro, as crônicas que mais me marcaram foram Ela, que é um relato de um pai de família depois de ter comprado a 1ª televisão; O estranho procedimento de Dona Dolores, quando a protagonista da história começa a agir como se fosse a Aracy da TopTherm ("vamos falar de coisa boa?"); e a do título, O Nariz, que conta o drama de um respeitado senhor que é tido como louco por ter começado a usar o apetrecho óculos-nariz-bigode do Groucho Marx.

em Diálogos Impossíveis, LFV usa de toda a sua loucura para trazer os textos no tema da coletânea. é delicioso se perder nas situações improváveis descritas, especialmente quando os protagonistas são figuras conhecidas, como Robespierre ou Einstein.

é importante dizer que não se tratam de textos que façam com que o leitor irrompa em gargalhadas (o que acontece nos seus outros livros), mas ele traz textos leves e profundos, deleitando quem os lê de forma arrebatadora.

a seguir, o meu favorito:

Picasso e Goya Sob o Sol

Uma tarde, depois de um bom almoço, estirado numa cadeira preguiçosa no terraço da sua casa na Côte d"Azur, Picasso adormece e sonha que está no museu do Prado, em Madri, na frente do quadro As Meninas do Velázquez, e que ao seu lado está alguém que a princípio ele não reconhece. Ele e o outro são as únicas pessoas no grande salão do museu onde a pintura de Velázquez é o único quadro. A pintura de Velázquez é o único quadro no museu inteiro.

Picasso julga reconhecer o homem ao seu lado, mas não tem certeza de que seja quem está pensando.

-- De onde eu conheço o senhor?

-- Talvez dos meus autorretratos...

-- Francisco Goya!

-- Em pessoa. Ou o que resta dela. E o senhor é...

-- Pablo Picasso.

-- Foi o que eu desconfiei. Mas nos seus autorretratos o senhor nem sempre é reconhecível...

-- É que eu nunca aceitei que os dois olhos não pudessem ser do mesmo lado do nariz.

-- Mas eu deveria ter lhe reconhecido pelas fotografias. O senhor é uma das pessoas mais fotografadas do mundo. Eu o invejo.

-- Por ser tão fotografado?

-- Não. Por poder pintar os dois olhos no mesmo lado do nariz. E a boca onde quiser. E os pés no lugar das orelhas. Eu não tive essa liberdade. Fui um revolucionário na minha arte, mas não o bastante. Éramos reféns da anatomia. O senhor se libertou disso.

-- Me diga, o que o senhor acha desta ideia de esvaziar o Prado e deixar só As Meninas do Velasquez em exposição?

-- Acho justo. É uma maneira de dizer que, depois de Velázquez, toda a pintura é supérflua.

-- Mas as suas pinturas negras também foram banidas do museu, com todas as outras...

-- Está certo. Eu não as pintei para serem expostas. Foram pintadas nas paredes da minha casa, para só serem vistas por mim. São expressões da minha misantropia, do meu asco pela vida, da minha loucura final. Quem quer ver a sua degradação exposta em público?

-- Elas são as pinturas mais poderosas e inquietantes jamais feitas. E olha que eu não sou de elogiar a concorrência.

-- O seu Guernica não fica atrás...

-- Obrigado, mas eu acho Guernica uma ode à inutilidade da arte. Foi elogiado como um libelo contra a estupidez humana, mas não impediu que outras "Guernicas" acontecessem, e a estupidez humana prevalecesse. Guernica foi apenas um aperitivo para Hiroshima.

-- Somos supérfluos de várias maneiras, além da que decretou o Prado. Todo artista é supérfluo.

-- Menos o Velázquez.

-- Menos o Velázquez.

-- Sabe, senhor Goya, muita gente já nos comparou, e notou como nossas trajetórias são opostas. O senhor começou como pintor da corte, retratando a vida alegre da aristocracia na Madri dos Bourbons e acabou doente, num exílio amargo entre pinturas negras, sozinho e esquecido. Sua trajetória foi da frivolidade para as trevas. Eu, ao contrário, fui ficando cada vez mais mundano, cada vez mais frívolo. Comecei como um artista de vanguarda incompreendido e acabei como uma celebridade internacional, uma das pessoas mais fotografadas do mundo, fazendo arte instantânea como criança. Apesar de velho, ainda tenho saúde e tesão pela vida. Agora mesmo, acabo de comer um peixe maravilhoso feito pela minha atual mulher... A sétima, se não perdi a conta.

-- Por sinal, senhor Picasso, obrigado por sonhar comigo na sua sesta. A única maneira que eu tenho de voltar à vida, nem que seja só para rever As Meninas, é na imaginação dos outros. E, não sei se o senhor notou, no seu sonho eu não sou surdo, como fui durante grande parte da minha vida. Muito obrigado.

-- Olhe, senhor Goya! Que estranha luminosidade emana do quadro do Velázquez! O senhor não está vendo?

-- Não, eu...

-- Parece o sol. É a luz de um sol!

Picasso acorda com o sol na sua cara. Pensa em chamar a mulher para lhe trazer um chapéu, mas não se lembra do seu nome.  

terça-feira, 18 de março de 2014

C13 - Ninfomaníaca - Volume II

diferentemente do que ocorreu no 1º volume, que eu não tinha me decidido se ia querer ver mesmo o filme (minha relação com o Lars Von Trier é, no mínimo, controversa), neste fui logo no dia da estreia (da outra vez eu já havia lido muito spoilers, quis evitar a fadiga!).

dessa vez, não teve como passar despercebido que a versão brasileira tem mutilações -- em alguns momentos a dinâmica do filme se fragmenta de forma pouco condizente com a narrativa.

mas, apesar desses poréns, gostei muito do 2º volume (apesar de ter achado a primeira parte mais instigadora). sei que a história tinha que começar a afunilar, e o seu desenrolar não me decepcionou.

Ninfomaníaca é uma dança muito bem orquestrada entre os conceitos do que é natural, do que é inato e do que é natureza -- não por acaso têm o mesmo radical, mas são passíveis de suscitar ideias distintas, quando aliadas à trama.

no 2º volume, o mundo fica maior: faz-se relação mais ampla de Joe com o ambiente, e de como a sua presença catalisa alguns comportamentos.

a nudez da protagonista como os seus sentimentos e com as suas vontades fez com que eu até me esquecesse da nudez literal. é uma história onde não há nada morno; tudo é extremo.

inocência e malícia correm de um personagem para o outro, sem se fixar em um ponto. a dicotomia original entre repressão e liberdade é tão esgarçada, que presenciamos liberdade repressora e repressão libertadora, inclusive.

em um determinado momento, após muito apanhar (não só da vida), Joe resolveu que precisava caber em alguma classificação social, que não podia continuar sendo o que era... e ela se enterrou em si mesma, tentando se compreender e se corrigir (ou se aceitar).

quando ela resolveu matar os seus instintos, o filme nos presenteia com uma das suas cenas mais poéticas, ao som do Réquiem de Mozart (que amo incondicionalmente!).

não preciso mais nem falar das atuações primorosas, mas não me furto de fazer loas às maravilhosas digressões, que ilustram, quase como parábolas bíblicas, a conversa entre Joe e Seligman.

em alguns momentos, o tom beirando o professoral que o filme assume acaba trazendo à tona o que estava, no mínimo, no inconsciente do expectador.

quem imagina que Ninfomaníaca se trata meramente de um pornô cult (isso existe?), precisa urgentemente rever os seus conceitos.

p.s. e a música que encerra o filme (assistam!) é perfeita: por seu texto, por sua história e pela sua pertinência com a protagonista.

sexta-feira, 14 de março de 2014

L06 - Persépolis

ganhei Persépolis no meu aniversário do ano passado, dos lindos mais lindos Mariana e João Vilnei, um sopro de carinho vindo de Portugal (com a versão em português de lá). sempre que aparecia uma expressão específica (como fixe ou montra), sentia-me novamente com eles, nas férias que tivemos e que teremos <3

voltando ao livro, comecei a lê-lo assim que o ganhei, mas, ainda que seja uma graphic novel, o assunto não é de tão rápida assimilação, e eu me pegava divagando horas e, quando via, não tinha passado de 10 páginas (o que acho ótimo, inclusive).

então apareceu um concurso interessante, de salário ainda mais interessante, e o livro foi para a prateleira, lido pela metade, esperando o momento certo de voltar para as minhas mãos e, principalmente, para a minha cabeça.

essa semana eu o agarrei pelos chifres, reli o começo e não consegui mais parar. Persépolis é a autobiografia de Marjane Satrapi, que conta nos quadrinhos o recorte da sua vida, dos 10 aos 20 e poucos anos (período que compreendeu desde a revolução islâmica do Irã até a guerra do golfo, iniciada em 1990).

a dificuldade dela, por conta da pouca idade, para compreender o que acontecia e para se adaptar ao retrocesso que a dita "revolução" trouxe, é narrada na primeira parte do livro. na segunda parte, Marjane conta a sua história a partir dos 14 anos, quando vai estudar na Áustria por 4 anos (sem falar alemão e sozinha -- sua família se manteve no Irã).

estimulada desde sempre a ser ela mesma e não aceitar tacitamente dogmas, Marjane é uma iconoclasta. e é interessantíssimo vê-la questionar os valores impostos pelo Irã, pela sociedade, por ela mesma...

enquanto eu lia, percebia quão pouco eu conhecia a realidade dela. quando a guerra do golfo começou, eu tinha 12 anos, e não suportava ver aquelas telas verdes na tv, o tempo inteiro, o dia inteiro. admito, com vergonha, que escolhi me manter distante, ignorar e não tentar compreender o que se passava ali. mas ela não fez essa escolha, e nem a faria, se pudesse.

tudo nela parece mais extremo (sem trocadilhos com extremismo religioso): viu amigos morrerem, parentes "desaparecerem", crianças serem cooptadas pelo exército, com a promessa de serem recompensados após a morte, foi separada da família para ter uma oportunidade de estudar, mas, incrivelmente, o que quase a matou foi uma desilusão amorosa.

é incrível como cada um escolhe as suas guerras... ela poderia ter quebrado por qualquer dos motivos já citados, mas culpava-se por quase ter morrido (sim, isso quase aconteceu, ela chegou ao fundo do poço montada numa britadeira) por ter acabado um namoro com uma cara que ela tinha consciência de que era um babaca completo.

do lado de cá, é muito difícil não julgar os motivos por que as pessoas sucumbem -- não ficamos pedindo o tempo todo, metaforicamente, para pensarem nas crianças mudas telepáticas? não queremos que as pessoas vejam o que nos é óbvio?

ao mesmo tempo, como deve ficar a cabeça da pessoa que compreende toda a lógica de que não deve se afundar no acolchoado sofá mental, mas que não consegue se levantar? e provavelmente ainda tem que lidar com a culpa, o torpor e a autocomiseração...

no meio dessa espiral descendente, já de volta ao Irã e à base de remédios, Marjane foi visitar um amigo de infância, que havia voltado da guerra sem um braço e uma perna. antes de encontrá-lo, ela achava que ele estaria numa depressão pior do que a dela, mas foi uma grata surpresa que ele estivesse de bom humor, inclusive fazendo piadas.
nesse dia, aprendi uma coisa essencial: só conseguimos sentir pena de nós mesmos quando as nossas desgraças ainda são suportáveis... quando se ultrapassa esse limite, a única maneira de suportar o insuportável é rirmo-nos dele.
e o humor voltou, para lhe segurar a mão e às vezes lhe fazer cócegas, quando mais precisava.

na trama, a avó dela personificava a irreverência, a rebeldia e a capacidade de rir de si mesma -- tão parecida com a minha que me torceu o coração de saudades.

domingo, 2 de março de 2014

L05 - O Espadachim de Carvão

ano passado eu fui assistir Girl Most Likely (Minha Vida dava um Filme), com a maravilhosa Kristen Wiig (gostei muito, apesar de achar que ele teria sido muito melhor se tivesse terminado 2 minutos antes) e, enquanto esperava a sessão começar (fui bem mais cedo, pra conseguir um lugar tranquilo para estacionar), resolvi ouvir o Nerdcast sobre Literatura Fantástica Brasileira, e a mistura mexeu muito comigo.

essa combinação me despertou a ideia de voltar a escrever (este blog é um produto desta epifania, inclusive), fechar alguns projetos antigos e, quem sabe, num futuro ainda sem prazo, catalogar o redemoinho que habita a minha cabeça em algo tangível.

voltando ao Nerdcast, de cara, já fiquei curiosíssima com todos os livros, especialmente depois das falas dos autores, mas o que entrou na lista primeiro foi O Espadachim de Carvão, do Affonso Solano.

finalmente consegui me organizar pra lê-lo e adorei -- sei que havia muito pouca chance de eu não gostar, pois, além de literatura fantástica ser o meu gênero favorito,  a narrativa é bem escrita, envolvente, rica, e muito bem amarrada.

Adapak descobrindo Kurgala nos leva nesta viagem para que nós também entremos neste mundo de cabeça. as conversas dele com o seu pai e com os seus tutores são bem interessantes, e dignas de serem relidas (vou me guardar para voltar à Kurgala quando o segundo livro for lançado, para ler os dois de uma vez só).

outro ponto de que gostei foi da escolha no número de entidades divinas -- enquanto a maioria dos livros fantásticos oscila entre os cabalísticos 3 ou 7, é muito raro colocarem 4. eu gosto da dinâmica de 4 figuras de autoridade, remete-me à perfeição do quadrado -- sei que podia ser um trapézio ou um losango, mas imaginei um quadrado pois, se houvesse um superior ao outro, não havia necessidade de se nomear os subjugados (perdão pela confusão matemática, ainda tô meio bêbada, e os números resolvem sair pelos poros).

além disso, a cadência de cronologia não linear consegue despertar uma vontade louca de xingar o autor por deixar o capítulo anterior no acorde suspenso, mas esta vontade passa rápido. e volta no final do próximo capítulo. e passa. e estou agora no limbo, esperando o próximo livro.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

C12 - Ela

esse o foi último que vi no pancadão do final de semana passado, e, a despeito dos outros, que foram grandes produções (Clube de Compras Dallas e 12 Anos de Solidão) foi o que mais me marcou.

sou aficionada por distopias (futuros sombrios, porém possíveis) e, ainda que Ela possa ser considerada uma distopia sutil (por não conter fortemente governos autoritários), a opressão tecnológica e social está bastante presente.

Theodore é um cara solitário. recém-divorciado, ele evita o contato humano durante quase toda a sua rotina de ida e volta do trabalho. salvo um casal amigo e o recepcionista do trabalho, ele praticamente não conversa com ninguém.

de início, pode parecer que ele é mais um dos muitos misantropos que apareceram nos últimos filmes que vi, mas Theodore quer ter alguém (talvez por isso ele não consiga superar o fim do seu casamento e relute tanto em assinar o divórcio), só é tímido e desajeitado demais para sair do casulo.

um dia, voltando do trabalho, ele vê que lançaram um novo sistema operacional (quase um tamagotchi que conversa com o dono) e resolve comprar um. e é assim que Theodore conhece "Samantha" (voz da Scarlett Johansson), o sistema formulado para ele, após responder a algumas perguntas.

o sistema começa a evoluir enquanto conversa com ele, e acabam ficando íntimos -- íntimos MESMO! --, ao ponto de Theodore assumir publicamente que está em um relacionamento (sexual, inclusive) com Samantha, e de levá-la a um double date (o outro casal era de 2 pessoas).

o que mexeu comigo foi ver que muitas pessoas começaram a se relacionar desta forma, tudo visto com muita naturalidade, por grande parte da sociedade. me apavora ter a consciência de que estamos nos encaminhando para isso. enquanto muitos passavam nas ruas, conversando animadamente com os seus sistemas operacionais, eu só me lembrava da imagem abaixo:

"flagrada pessoa observando o mundo"
e eu percebi que não quero deixar de observar o mundo. eu gosto de ser surpreendida pelas coisas que pulam na minha cabeça quando estou andando na rua... não subestimo a capacidade do computador, mas ele ainda não pode pensar por mim -- e mesmo que venha a poder, eu ainda prefiro todo o redemoinho caótico da minha mente.

talvez esse filme tenha sido o estopim para me fazer ver o que há muito já era óbvio e recorrente, mas que eu ainda não havia tomado consciência: não consigo mais conviver com o facebook -- ele me toma tempo demais e me dá retorno de menos.

o que me manteve na rede, por muito tempo, foi o contato com algumas pessoas em especial, apenas por lá. mas finalmente entendi que isso foi uma desculpa para me manter preguiçosamente onde estava. amizade não depende disso (se depender, não é amizade). vou tentar fazer uso de novas tecnologias, como telefone ou até encontro presencial -- espero que funcione!

ou seja: vou experimentar dar um ou dois passos pra trás, pra tentar me encontrar -- ou me perder de vez :P

C11 - 12 Anos de Escravidão

o filme adapta a história real de Solomon Northup, um negro livre, alfabetizado, violinista, casado e pai de 2 filhos, reconhecido e respeitado em NY.

mas ele é vítima de um sequestro -- na época em que se passa o filme, nem todos os estados americanos haviam abolido a escravidão, e muitos negros livres eram sequestrados e vendidos para fazendas em locais onde a escravidão ainda era lei.

Solomon tentava não se render ao desespero ou à situação (cada vez pior) a que era imposto, com o passar do tempo. ele teve que aprender a lidar com as situações e demonstrou que a violência mental à qual era submetido era ainda maior que o cárcere e a violência física. em alguns momentos, ele quase paralisou, pra tentar manter a esperança de conseguir se livrar do seu jugo.

o filme é forte e atemporal, e os absurdos mostrados, que não se justificam, servem de alerta para o que ainda acontece. recentemente, uma australiana foi presa em brasólia, por racismo. teve o caso do rapaz que foi amarrado em um pelourinho e espancado.

esse povo come cocô? em que mundo isso faz algum sentido?


C10 - Clube de Compras Dallas

fui assistir a este filme extremamente curiosa, especialmente pela boa crítica recebida pelo Matthew McConaughey, como ator principal -- admito ter um certo preconceito com ele, por conta das suas escolhas exóticas de papéis, mas tenho muito carinho pelas suas participações em Tempo de Matar, Contato e EdTV.

mexem muito comigo filmes que tratam de se estar consciente de que se tem os dias contados, principalmente porque é algo que eu não faço ideia de como reagiria, se fosse comigo.

Ron (personagem de Matthew) descobriu que estava com AIDS (a doença já havia se manifestado) em 1985, época em que era considerada uma espécie de "peste gay".

Ron, texano, hétero e homofóbico, usou 1 dos 30 dias que o médico que o diagnosticou lhe deu de vida em negação. os outros ele usou para lutar, não aceitando seu vaticínio com resignação. e foi assim que ele pulou do alto do penhasco metafórico, rumo ao tempestuoso mar azul escuro, que o aguardava, impaciente.

durante a exibição, vieram-me à memória algumas tentativas da TV de prestar informações sobre a AIDS, nos anos 80. eu devia ter uns 10 anos (1988) quando uma das sitcoms populares na época (não me lembro do nome, mas acho que foi na finada Manchete) recebeu uma "visita" de um personagem soropositivo. tentaram mostrar que não havia risco de contágio por mero contato, mas tudo o que o Midas tocava ou era isolado ou era jogado fora... quanta desinformação! e quão desesperador deve ter sido para os que foram diagnosticados nesta época, onde o medo talvez fosse tão ou mais nocivo do que a própria doença!

e não dá para não trazer a temática para a vida real: conheci um rapaz que, da data do diagnóstico até ele sucumbir foram cerca de 30 dias. os amigos próximos disseram que ele não conseguiu lidar com a notícia e que "perdeu a vontade de viver".

por outro lado, trabalhei com uma menina linda e super alegre, que um dia me contou a sua história (que eu nem desconfiava): estava grávida do 2º filho quando o marido foi hospitalizado com meningite. o médico a chamou de lado, explicou-lhe que aquele tipo da doença acometia geralmente pessoas com a imunidade baixa, e ela se apavorou. fez o teste, deu positivo, começou o tratamento e o bebê nasceu sem o vírus. e o marido não sobreviveu àquela internação. da última vez que nos vimos, ela estava noiva de um cara maravilhoso, que precisou de muita paciência e persistência, para convencê-la de que a amava do jeito que ela era.

talvez por conta dessas e de tantas outras histórias, emociono-me muito com quem não se rende, com quem pode até aceitar o destino que aparece nas cartas, mas o caminho até lá é feito nos seus termos.

no caso de Ron, não se render também significou reaprender a viver. neste processo, o tipo truculento, preconceituoso e egoísta começou a perceber a existência e os problemas de outras pessoas, dando à sua vida (e à dos outros) sentido.

menção honrosa para as interpretações do Matthew McConaughey e do Jared Leto, prováveis ganhadores do Oscar de Melhor Ator e Melhor Ator Coadjuvante, respectivamente.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

C09 - Eu e Você

domingo passado resolvi aproveitar a hora que ganhei com o fim do demoníaco horário de verão no cinema, e fui ver o último filme do Bertolucci.

o filme conta a história de Lorenzo, de 14 anos, e que, como a maioria nessa idade, é todo arrogância e espinhas. além disso, ele é muito estranho, mimado e metódico.

Lorenzo resolveu pegar o dinheiro que pagaria à escola para passar uma semana esquiando, comprou comida (7 provisões iguais, este menino é virginiano) e começou a levar os seus víveres para o porão do prédio onde mora (onde quase ninguém vai, e que ele tirou uma cópia da chave).

para não ficar totalmente sozinho, ele levou uma colônia de formigas como companhia (nessa hora, sobe a trilha dos violinos do Chaves, com o tema de E O Vento Levou).

após um dia inteiro de sorridente solidão e de contraditória liberdade (enclausurado, mas sem limites e sem ordens), chega a sua meia irmã (filhos do mesmo pai), Olívia, como um furacão de vida naquele cubículo, e finalmente o filme começou, pra mim.

ela é fascinante, aos olhos dele e aos de quem a assiste: quase um caleidoscópio, feita de efêmeros cacos de vidro, que, a cada ângulo de luz, assume formatos avassaladores.

e é da relação deles (ambos escondidos, durante a semana sabática de Lorenzo) que o filme se desenvolve.

a trilha sonora é um personagem à parte, especialmente por Space Oddity: a original, do David Bowie, e a versão italiana de Mogol, de uma poesia de arrepiar (essa música mexe comigo de uma maneira que nem sei explicar... um dia ainda consigo colocar em palavras tudo o que ela me desperta...)!

outro ponto interessante a ser ressaltado, é que Bertolucci não se preocupou em explicar a razão de Lorenzo ser chatíssimo, e isso é maravilhoso! não há moralização do que se é ou do que se devia ser, há "apenas" o recorte daquele tempo compartilhado com a irmã, que talvez os marquem para sempre!

nem tudo precisa de explicação. nem sempre há algum segredo/trauma/motivo.

e há épocas em que estamos impróprios para o consumo humano. ponto final.


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

C08 - Trapaça

sábado passado fugi pra assistir Trapaça, antes de voltar à rotina que eu deveria ter (mas que ainda mal comecei) de estudar para os concursos "em cartaz" até o final do primeiro semestre.

eu estava me remoendo de remorsos por estar fora da biblioteca naquele começo de tarde, mas, quando entrei na fila pra comprar o ingresso, reconheci a pessoa que estava na minha frente, no Casa Park.

pra algumas coisas, como diz a minha avó, eu sou muito "muderna", mas, pra outras, sou extremamente desconfiada... e se tem algo com o que eu tenho um receio monstruoso é de entrar em aplicativos ou salas de bate-papo, com o objetivo de conhecer pessoas!

sou old-fashioned nesse quesito, nunca prescindi de olho no olho, de "bater o santo" ao vivo, de ter alguém a quem eu possa referenciar a criatura que estou conhecendo... ser amigo dos meus amigos próximos é um excelente cartão de visitas (mas não se sustenta sem que a pessoa tenha alguma substância).

por isso, assumo que mordi a língua ("dicunforça") com o twitter. pode parecer óbvio para os usuários mais massivos, mas eu comecei a seguir algumas pessoas, conhecer o seu senso de humor e de escrita (e me encantar com a loucura alheia), e comecei a seguir alguns que os primeiros seguiam, por compatibilidade de gênios...

assim, não me lembro ao certo de como cheguei até o @philosopop, mas sei porque continuei: dono de um humor impecável e ferino (meu número!), analista de realities shows (não só as bagaceiras brasileiras) e de o que mais cair na sua mente/frente, tem o "agravante" de também morar em brasólia.

quando o vi, na fila do ingresso, nem titubeei em fazer o momento tiete e conversamos um tempo sobre a vida em brasólia, cinema, realities e afins, junto do também gente finíssima @danielcouri :)

o mais interessante disso tudo foi vivenciar a inversão da ordem padrão de se conhecer pessoas, e a compreensão de que, há muito, as redes sociais se tornaram um emaranhado de relações, interesses e possibilidades.

eles foram assistir a outra sessão e eu fui para a sala, ver o meu filme, ainda rindo por dentro, do que tinha acabado de acontecer...

como eu havia dito pra eles, estava curiosíssima para descobrir se o Christian Bale havia feito fono (ele mal abria a boca para falar, no Batman), e fui surpreendida (para o bem) com a sua atuação -- quem sabe, agora, eu consiga ver O Vencedor, que também é do David O. Russel, sem grandes preconceitos com o protagonista?

outro merecido destaque a ser feito é para Amy Adams, incrível, e que, junto do Christian Bale, conseguiram ofuscar Jennifer Lawrence e Bradley Cooper (também favoritos do diretor, atuaram juntos em O Lado Bom da Vida, rendendo a ela o Oscar de Melhor Atriz).

além da trilha sonora maravilhosa e do figurino impecável, preciso assumir a minha tendência a torcer pelos que vivem fora da moral: há quem viva sob regras e as siga à risca, mas há quem conviva com elas de forma fluida, percebendo os seus furos e se desgarrando da boiada.

por isso, amo tanto os vigaristas, os desajustados, aqueles que tinham tudo para serem uma mera carcaça, mas que, ao contrário, se rebelam!

mais do que apenas sobreviver, os que saem do roteiro verdadeiramente vivem!

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

L04 - As Vantagens de ser Invisível

eu não sou uma pessoa boa. não mesmo. eu julgo, eu comparo, eu especulo, eu fecho gestalts... não sei se todo mundo é assim, mas a impressão que me passa é que as pessoas não costumam se assumir, ou tentam ser aquilo o que os outros querem que elas sejam.

geralmente, sucumbimos a isso na adolescência (querer não ser, independente do que se sinta, também é dar satisfação da sua vida para os outros), mas há pessoas que são assim pra sempre: passam tanto tempo tentando agradar aos outros que se põem em último lugar.

esse prelúdio foi um pouco para falar que nunca presenciei ninguém se expressar tão crua e despidamente como nas cartas de Charlie (pseudônimo), o protagonista desta história. o livro é todo contado por meio dos relatos dele para alguém que ele não conhece e que não tem o seu endereço, para responder de volta.

Charlie tem 15 anos e está passando por uma fase realmente difícil: vai começar o ensino médio, o irmão mais velho está indo embora, o melhor amigo dele se matou no verão anterior e ele não sabe muito bem como lidar com tudo sozinho.

mas quem sabe? quem tem as respostas, com essa idade?

olhando pra trás, acho que o ano em que fiz 15 foi um dos piores da minha vida... nossa, como eu era babaca (mais do que sou hoje, acreditem!)! eu era blasée, não sabia como me comportar no mundo novo que estava acontecendo, extremamente impaciente e autocentrada, e tinha muita raiva dos modelos prêt-à-porter que eram considerados válidos nos círculos sociais onde andava.

por um tempo, juro, eu quis caber naquilo tudo. até perder a paciência e ligar o foda-se!

no final deste ano, eu tinha conseguido a proeza de ter ficado em recuperação em todas as matérias, exceto inglês. e a que quase me reprovou foi literatura... mas esses tenebrosos meses me prepararam para o que sou hoje e, já indo para os 16 (amém!), comecei o meu relacionamento mais duradouro e gratificante: com os livros.

tive um professor maravilhoso, assumidamente gay (coisa rara, nos early 90's), que chegou quebrando com os paradigmas sacais de ler por obrigação. na sua primeira aula, foi o único que não falou de vestibular ou de obrigações de provas. ele contou, com os olhos brilhando, os livros que mais o tinham marcado na vida, e começou a citar as partes mais interessantes deles.

dos 3 que mais me marcaram da lista pessoal do professor, tinha um na estante de casa: O Perfume, de Patrick Süskind. resolvi pegá-lo numa tarde, mas quem me pegou, de fato, foi ele. demorei 2 semanas para terminá-lo, pois lia devagar e me deliciava com a loucura carente e megalomaníaca de Grenouille.

dali em diante, comecei a ler tudo o que me parecesse diferente (inclusive grandes clássicos, que não são clássicos por acaso). nisso, Charlie e eu nos aproximamos. ele devorava os livros que Bill, seu professor, indicava, além da lista obrigatória.

Charlie é apenas 2 anos mais velho que eu, e suas referências comportamentais, musicais e de tv me são muito fortes e significativas (talvez por isso, tenha devorado a sua história em menos de 24 horas).

a geração de hoje não tem como valorizar uma fita de músicas favoritas, por exemplo. o trabalho que dava pra fazer isso e a satisfação ao ter quase uma obra de arte personalizada nas mãos... mixtapes eram tão pessoais que algumas minhas nunca foram emprestadas ou ouvidas por ninguém, além de mim.

se eu conhecesse Charlie, teria uma relação extrema com ele: ou o adoraria ou o odiaria, mas, por mais que ele, em alguns momentos, se torne/ache invisível, ele não me passaria despercebido.

porém, como eu disse no começo desse texto, eu o julgaria. muito. porque ele é ainda mais complexo e atarantado do que se é, aos 15.

Charlie não é linear (não acho que ninguém o seja), e o melhor: não tenta sê-lo. ele se afunda no seu emaranhado de ideias, ora desatento, ora vendo o que ninguém vê. acredito que talvez essa loucura, às vezes canalizada, nos atrairia.

como imagino estar claro, gostei muito do livro, especialmente por conta da visão de mundo do protagonista (que lembra muito um grande amigo meu, o João Vilnei), e estou francamente curiosa para ver a sua adaptação para o cinema. nesse final de semana, se a minha agenda deixar, tentarei vê-lo.

UPDATE

vi o filme no dia seguinte (8 de fevereiro). mesmo com o elenco excepcional (Logan Lerman, Emma Watson e Ezra Miller), o livro ainda foi infinitamente melhor do que a adaptação para o cinema.

talvez pela delicadeza do tema, no filme tudo fica mais raso...

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

L03 - O Chamado do Cuco

ontem terminei o 1º livro que eu escolhi para ler este ano -- os do Almodóvar pularam na minha cabeça e eles não foram escolha, foram prioridade!

entre os muitos títulos (que comprei ou baixei nos últimos tempos) e que me lançam olhadas with lasers por eu não lhes dar a atenção devida, este livro me ganhou por um motivo muito simples (não, não foi apenas porque a J. K. Rowling o escreveu e eu estava curiosa): quando baixei o arquivo para o meu kobo, seu nome de guerra ficou ochamadodocu.epub -- como não atender prontamente a este chamado? :P

claro que o meu primeiro trabalho foi descobrir o que significava o pseudônimo de titia Joanne, que é chegada numas mensagens subliminares (e que depois faz esquema com multinacionais pra enlouquecer os fãs!)...

[miniflashback slash devaneio]
na época em que o finado orkut borbulhava de teorias da conspiração pós-morte de Sirius Black e aguardando furiosamente o lançamento do 6º livro com uma foto do Serginho Mallandro dizendo que tinha sido pegadinha, o povo se pegava em qualquer coisa para justificar furos na história.

então, poucas semanas antes de sair o Half-Blood Prince, ocorreu o "efeito mcdonalds": a rede de fastfood lançou uma campanha de significados de nomes nos protetores de bandeja e, no meio de 357 nomes, apareceu Hermione, cujo significado é aquela que guarda um segredo.

ficaram tão surtados achando que ela saberia que Sirius não havia morrido que se esqueceram de que, no 3º livro, há um capítulo chamado O Segredo de Hermione e que todos (eu disse TODOS) os nomes da série foram escolhidos pelo seu significado.

mas a maior teoria da conspiração foi o fato de essa campanha, que trazia, na sua maioria, nomes comuns, ter trazido um nome tão emblemático para os fãs da série. #JKRowlingMente
[/miniflasback slash devaneio]

voltando à vaca fria, me senti jogando Torto (Revista Coquetel) para descobrir que mensagem titia queria deixar para os seus fãs, e fiquei muito surpresa (mentira! fiquei #chatiada por não ser I am Lord Voldemort) por ter achado um anagrama artístico e até concordar com ela :P

mesmo com erro de concordância, tá?
saindo das subliminaridades, vou ao enredo. o livro é um romance policial, que começa com uma supermodelo que tinha problemas com drogas e que "caiu" da sacada do seu apartamento para a morte. a polícia arquivou o caso dizendo que havia sido suicídio, mas o irmão da vítima não se conformou com isso e resolveu contratar um detetive com sérios problemas financeiros (e pessoais), que havia sido amigo do seu também falecido irmão, na adolescência.

admito que tive medo, muito medo. não da história em si, mas de que titia surtasse ou tomasse as bolas que algumas vezes Agatha Christie era chegada, para fazer uma história cheia de pontas soltas e depois o assassino ser o cara que tava atrás do coqueiro e que nunca tinha aparecido na história (uso indiscriminado de Deus ex Machina).

pequeno adendo: preciso aqui defender o fenomenal O Caso dos 10 Negrinhos (Agatha Christie), pois não entra na lista de livros dadaístas de crimes.

obviamente, a história é muito bem escrita, muito bem amarrada, mas não teve o pleonástico encanto da sua saga anterior... é uma escrita mais adulta (claro!), e tem bastante potencial  (há indícios óbvios de que Cormoran Strike voltará a solucionar mistérios).

aprendi até uma palavra nova (no estilo nunca te vi, sempre te pratiquei amei): Diatribe (s.f. Crítica severa e mordaz; escrito ou discurso agressivo e injurioso) :)

nem sei se ela está escrevendo um próximo, mas, caso afimativo, espero que o nome fique tão excelente quanto esse, quando for reduzido a 12 caracteres :P

p.s. a melhor aquisição que já fiz nos últimos tempos foi o meu kobo! adoro o cheiro de livro novo, mas poder ler muito tempo deitada sem ter que segurar muito peso e poder desligar a luz do quarto e ler só com a luz do reader me ganhou para sempre! ♥

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

C07 - Ninfomaníaca



atravessei a tarde inteira, de sala em sala de cinema, para chegar ao terceiro.

♥ ♥ ♥
deixei passar algumas semanas da estreia, mesmo sabendo que iria chegar até a sessão contaminada com as opiniões (com fundamento ou não) que eu visse por aí, como várias pessoas fazendo piadas do tipo "fulaninho vai ficar mais traumatizado que os filhos da Uma Thurman, no Ninfomaníaca" (e eu imaginando uma cena fudidaça de sexo, capaz de traumatizar as famílias -- aloka!) ou as paródias do cartaz :P

soma-se a isso o fato de que eu só havia visto do Lars Von Trier o Dançando no Escuro, que quase me desmanchou em lágrimas, fazendo com que eu precisasse ficar sozinha (uma noite inteira), para me recompor -- o que frustrou uma possível volta de um namoro que não devia mesmo ter sobrevida (obrigada pelo timing, amigow!) --, e eu estava curiosíssima pelo filme.

o problema é que eu não consegui prestar muita atenção no começo, porque um baitola levou um galeto enrolado em 5 metros de papel alumínio, e ficou fazendo um barulho demoníaco pra desembrulhar a marmita e depois ficou se agarrando com a embalagem um bom tempo, aquele puto!

voltando ao filme, fiquei impressionada com a educação da sala (exceto pelo barulhento da fileira atrás da minha), pois ninguém falou nada do tempo em que a tela ficou preta, no começo.

não vou ficar aqui falando sobre o conteúdo do filme, porque acho que todo mundo mais ou menos já sabe: é a narrativa da vida de uma ninfomaníaca.

mas o que me encantou com o filme foram as metáforas que conduziram o enredo, e que, tirando o senhorzinho que passou mal na sessão, aqui em brasólia, acredito ser senso comum que o filme não é um mero pornô, como muitos propagavam antes da estreia.

mesmo com a Uma Thurman roubando a cena, Stellan Skarsgård, Shia LaBeouf e Christian Slater também merecem destaque no elenco de excelentes atores.

o filme fez muito bem o seu papel em instigar o público a querer ver o 2º Volume (com estreia prevista para março agora), e estou particularmente curiosa para entender, afinal, o que pode ter ocorrido para que a protagonista, que aparece nos seus relatos como alguém que só se interessa pelo seu próprio prazer e por si, demonstrar tanto desprezo por tudo o que viveu [SPOILER ALERT: especialmente após a reação dela com a morte do pai].

C06 - Frozen

o segundo do pancadão do sábado passado foi Frozen, que admito só ter sabido que este filme existia uma semana antes de vê-lo e também admito tê-lo assistido por W.O. (o que eu queria mesmo assistir ia me dar um chá de cadeira de quase 2 horas, então resolvi me jogar -- rezando furiosamente para não ter dublagem do Luciano Huck, o trauma de Enrolados foi demais para o meu ♥)!

como eu estava no meu momento João das Neves, sem saber absolutamente de ♪ nada, nada, nada, naaaada ♫, no começo eu quase me virei pra um dos pivetes na sessão lotada pra tirar algumas dúvidas, porque o filme tem um roteiro bem menos óbvio do que os que estou acostumada, e achei que eu tinha perdido algo.

fiquei um pouco brôca confusa, principalmente, porque a história não é sobre a personagem que é diferente (Princesa Elsa, que tem o poder de congelar coisas), e sim, sobre a sua irmã caçula, Ana.

o pior é que nunca me lembro de que filme da disney sempre tem as cantorias sem fim (sou a cantora mais desunida da classe, odiiiiiiiiilho musicais, me julguem!), e eu me flagrava, em alguns momentos, desejando quase audivelmente "por favor, não cantem, por favor!".

não chega aos pés de Valente, mas os personagens são bem construídos, apesar de o roteiro ser aquela coisa meio água com açúcar com mensagem de autoajuda que os Beatles já faziam há 45 anos, no Yellow Submarine, e que foi explorada ad aeternum em muitas obras (oi, J. K. Rowling!).

foi uma sessão da tarde razoável, por mérito todo do Olaf (o boneco de neve) que, além de ser maravilhosamente fofo, fez com que eu repassasse toda essa conversa insana na cabeça, durante o filme, e rir.


C05 - A Fita Azul

sábado passado eu resolvi voltar a fazer pancadão cinematográfico (3 sessões de filmes seguidas), e o primeiro desta saga foi o A Fita Azul.

eu tinha visto o trailer e achei que o plot tinha uma grande chance de ser ou muito bom ou muito ruim, motivo suficiente para me levar ao cinema (essa audácia nos roteiros tem me rendido filmes interessantíssimos, como o melhor que vi ano passado, Branca de Neve, do Pablo Berger).

eu estava preparada para, pela segunda vez na vida, assistir à sessão completamente sozinha (a primeira foi ao ver o brasileiro Corda Bamba, também ano passado, também num pancadão triplo), mas um pai e sua filha de uns 11 anos (!!!) entraram, pouco antes da sessão começar.

o filme conta a história de Rachel, filha de um pastor de religião não nominada mas bastante conservadora, cuja família mora no interior de Utah, numa espécie de comunidade quase autossuficiente e avessa à tecnologia (numa vibe bem amish).

ela tem 15 anos e é completamente inocente, acreditando piamente em tudo o que lhe é dito (mas tem, dentro de si, dúvidas e inquietações que a impedem de uma mera ovelha).

na noite do seu aniversário, ela ouve, clandestinamente, a uma fita sem identificação (a famigerada fita azul). foi a primeira vez que ela ouviu rock, e ela comparou a sensação que aquilo lhe trouxe a uma espécie de arrebatamento.

e ela engravidou. da fita. como se o objeto fosse o próprio Espírito Santo.

quando a família descobriu que ela estava grávida, arranjou um casamento com um avulso qualquer, e Rachel fugiu, em busca do cantor da música que "a engravidou", aquele que ela acreditava que era pai do filho que carregava.

a leveza com que ela foi, aos poucos, descobrindo o mundo (ou não) me lembrou um pouco as histórias que Oliver Sacks escreve sobre seus pacientes, como a cena antológica do cego que fez uma cirurgia para voltar a enxergar e teve que ser apresentado a uma maçã (que ele só reconheceu após fechar os olhos) -- adaptada para o cinema no À Primeira Vista.

mas, o mais interessante (e aterrorizante) no filme, para mim, foi perceber o quanto as pessoas podem ser ingênuas e crédulas.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

C04 - A Grande Beleza

fiquei contraditoriamente feliz quando, ao chegar ao cinema, pois peguei uma fila de mais de 10 minutos para comprar o ingresso (detalhe: faltava mais de 40 minutos para o filme começar!). sala espantosamente lotada (feito incrível, mesmo para o ganhador de melhor filme estrangeiro do Golden Globe)!

a história começa numa festa Ibiza style, com ritmo frenético, sem que se entenda ao certo o que está rolando, até finalmente uma criatura sair de dentro de um bolo e perceber-se que se trata do aniversário de alguém.

este alguém deve ser, obviamente, rico, importante e influente. então, somos apresentados à Jep Gambardella, hedonista, irônico e carismático, escritor de um único livro (O Aparato Humano).

mora em Roma (a sacada da sua casa dá para o Coliseu), é jornalista (faz entrevistas a artistas), gira ao ritmo acelerado das muitas festas para as quais é convidado, dorme apenas quando o sol já nasceu, ou como ele mesmo diz, quando os outros estão se levantando.

um certo mal estar o acompanhou por fazer mais um ano (65, especificamente), mas ele tentava não dar muita atenção a isso, mantendo a sua "rotina". mas a notícia da morte de um grande amor do passado tirou-lhe o chão.

alguns filmes têm o poder de me fazer entrar na tela, esquecer-me de que estou na cadeira e de só me devolver no final, quando olho ao redor, espantada, e percebo que estava em transe. mas A Grande Beleza não é destes (pelo menos, para mim)... ele fez com que eu acompanhasse o questionamento do protagonista, também questionando a minha própria vida e as minhas próprias escolhas.

com o desenrolar da trama, fica claro que ele é um escritor frustrado, que menospreza o trabalho que faz, mas não tenta, de fato, escrever uma segunda obra -- nesta altura, não fica claro se tem medo de não conseguir escrever algo à altura da primeira, ou se está meramente esperando o insight aparecer.

neste meio tempo, apesar da sua visão blasée e sarcástica do mundo, há um fio de esperança, tênue e discreto, por trás.

quem não se identificaria quando ele decidiu que já tinha idade suficiente para não ter que fazer o que não quer? quem não se emocionaria com o seu olhar faminto e entregue às obras de arte que o rodeiam?

Henri Bergson, um dos expoentes no estudo sobre humor, explica que entre nós e a natureza, melhor, entre nós e nossa própria consciência, um véu se interpõe, véu espesso para o comum dos homens, leve véu, quase transparente, para o artista e para o poeta.

o véu, para Jep, é quase inexistente. mas ele escolheu usar uma venda.

porém a sua epifania vem de uma sucessão de circunstâncias inusitadas, que passam pela despedida de um grande amigo e por um truque de desaparecimento de uma girafa, culminando em uma revoada de flamingos... assim, não há venda que resista!

OFF - Labirinto de Paixões

outro Almodóvar estava na sacola de empréstimos do meu mecenas: Labirinto de Paixões foi o segundo da sua carreira. como todo louco que se preze tem padrões, percebe-se muito claramente as histórias que fazem parte da maioria de suas obras: sexo, diálogos frenéticos, relações familiares quebradas, baratismo e roupas espalhafatosas.

a trama corre de maneira, muitas vezes, bem lenta, o que torna o filme um pouco cansativo...

mas foi muito interessante ver a naturalidade com que os personagens encaravam todas as coisas que aconteciam, como a protagonista ser ninfomaníaca desde criança ou uma filha se resignar por ser violentada pelo pai com frequência...

mas, no final, tudo faz sentido, e não pude me furtar a comparar o roteiro de Labirinto com um encontro de A Moreninha com Nelson Rodrigues, adaptada para o cinema espanhol.

o camafeu, que redime os protagonistas de suas vidas errantes, é a aspirante a imperatriz: é ela quem parte a estrada em duas, que faz com que a vida de ambos seja só de desencontros, até que as trilhas novamente se cruzem.

realmente, não há título mais apropriado para este filme!

OFF - A Flor do Meu Segredo

mesmo com toda a minha assumida admiração pelo Almodóvar (vê-se pela quantidade de posts que a ele fazem referência), ainda não vi todos os seus filmes, especialmente os mais antigos (antes de 1997, pelo menos).

assim, sempre que posso, pego emprestado do meu mecenas em brasólia (hahaha) alguns filmes e, no meio da última leva, eu trouxe, entre outros, o A Flor do Meu Segredo.

é um filme muito bonito e até delicado, que fala de amor e suas circunstâncias: amor correspondido, platônico, traição, amor cego, amor familiar... mas tudo isso com aquela pimenta já característica!

com diálogos rápidos e intensos, a película gira ao redor de Leo (Marisa Paredes), uma mulher apaixonada pelo marido (que não mora mais em Madrid, por conta da guerra), que se sente extremamente sozinha e atravessa um hiato criativo, impedindo-a de escrever as melosas histórias de amor estilo Julia/Sabrina/Bianca, que publica sob pseudônimo e que é sucesso de vendas.

a primeira cena do filme, na qual ela calça botas que o marido a havia dado, mas que ela não as consegue descalçar sozinha, além de ser de uma carência beirando o MADA, faz referência direta à musa Patty Diphusa, que, em uma das suas crônicas, passa por cena semelhante.

essa carência se vê em todo o desenrolar da história, onde a personagem rui "aos muitos" ("aos poucos" é para os fracos!), ensimesmando-se no seu próprio drama, que não julga capaz de carregar, e não enxerga o mundo ao redor, as outras possibilidades que lhe aparecem na vida.

ao discutir com o marido (que ela o acusava de usar a guerra na Bósnia como desculpa para não lidar com o casamento deles), ele finalmente desiste e joga a pá de cal em cima do relacionamento:
-- (...) pensei que você era especialista em conflitos!
-- sim, mas não há guerra que se compare a você!
e ela quebra. "dicunforça".

a mãe (a insana e maravilhosa Chus Lampreave!) a diagnostica como "uma vaca sem badalo" (perdida, sem rumo e sem orientação), e Leo, aos poucos (agora sim: pra descer é sempre mais rápido do que pra subir, né?), começa a sair do casulo e a viver.

menção honrosa para a trilha sonora, especialmente a minha surpresa (não é tão surpreendente, eu sei) ao reconhecer Caetano cantando Ay Amor (ou Dolor y Vida), nos créditos finais. essa música faz parte do Fina Estampa, e esse disco me é emblemático, por causa do meu pai, que o adora, e que já me fez ouvi-lo trocentas vezes.

sábado, 18 de janeiro de 2014

C03 - O Lobo de Wall Street

sexta à noite, em brasólia.

quase nunca me aventuro em salas de cinema nesse horário, e me choquei ao ver a sessão LOTADA (não consegui sentar ao lado da minha amiga, só para se ter noção).

imagino que essa procura toda se deva, em parte, à mistura do "efeito Globo de Ouro" com as indicações do Oscar (melhor filme, ator, ator coadjuvante, roteiro adaptado e diretor).

é o segundo da lista de indicados ao prêmio principal que vejo, e o primeiro com indicado para melhor ator, mas não posso deixar de me render a Leonardo DiCaprio: incrível é pouco, para a atuação dele!

o filme adapta a história real de Jordan Belfort, cuja alcunha é o título do filme, e conta a sua ascensão meteórica no mercado de ações, unindo técnicas nada ortodoxas para chegar até o seu objetivo, que acaba sendo sempre querer mais.

chapava-se para suportar a pressão do trabalho, que, muitas vezes, se assemelhava a uma seita, com seus dogmas bem claros e expressos no speech de treinamento dos fiéis... pessoal e profissional se mesclaram, obviamente, e estar vivo era estar eternamente chapado.

mas o incrível é como um personagem tão avesso a todo tipo de regra é tão cativante! talvez seja a falta de pudor em ligar o foda-se, a pachorra em escolher viver nos seus termos e somente neles, independentemente das consequências...

torci por ele, torci para que, mesmo com "as galinhas voltando para o galinheiro", ele não perdesse essa essência iconoclasta que o pintava de laranja, na multidão de cinzentos.

vestir a roupa de um personagem tão fascinante não é fácil, mas Leonardo DiCaprio, há tempos, não é qualquer um.

Oscar, meu bem, morda a língua e entregue logo essa "estáuta" pra ele!

p.s. Jonah Hill também está maravilhoso, mas acho que o prêmio de ator coadjuvante dificilmente sairá das mãos de Jared Leto!